terça-feira, 25 de setembro de 2012

Masculino e feminino


Mestre em Dakshina Tantra Yoga fala sobre a sexualidade humana segundo a filosofia indiana




Por Alexandre Perlingeiro*

Nos últimos tempos, diversa tem sido a produção de matérias sobre a questão de gênero. Livros, entrevistas, filmes os mais variados estão buscando refletir sobre homens e mulheres, o que temos em comum e o que nos difere e caracteriza. E gostaria de contribuir com mais um ponto-de-vista sobre o tema.

Em minha opinião, falta acrescentar o aspecto psicológico da questão - que individualiza a análise. Quando falamos de homens e mulheres, estabelecemos generalizações que certamente são válidas para o grupo, mas que distorcem a realidade quando se olha para a pessoa. A descrição do gênero, por ser genérica, fala de uma mediana. O que gostaria de propor é um olhar individualizado para cada ponto dessa curva da espécie humana, com suas variantes idiossincráticas, desvios que não são desvios, e sim, nossa dinâmica pessoal interior. Por sinal, são essas diferenças de pessoa para pessoa que tornam tão bela e complexa a vida, impossibilitando uma análise estatística reducionista.

Ao invés de falarmos em homem e mulher, devemos olhar cada indivíduo como possuidor de características (físicas e psicológicas) masculinas e femininas.  Ao nível do indivíduo, não cabe dizer que o homem é assim e a mulher é assado. Com toda certeza nem todos os homens são assim e nem todas as mulheres são assado. Devemos olhar para aquele homem ou para aquela mulher e observar em que grau estão suas características masculinas e femininas (em cada um deles). Este homem, especificamente, em que grau ele é masculino e em que grau é feminino? E esta mulher, como ela é ao nível das suas características psicológicas?

Faz-se necessário, portanto, ter clareza dessas características de personalidade. O que é realmente ser masculino e ser feminino? De antemão, esclareço que não se trata de questão de sexualidade nem de opção sexual. Qualquer um, todos nós, independentemente do sexo e da opção sexual, cada um de nós possui características masculinas e femininas. Jung menciona a anima para os homens e o animus para as mulheres como sendo essa contraparte de nossa psique. Todo homem possui seu lado mulher e vice-versa.

No Tantra, independentemente do sexo, todos temos Idá e Pingalá, os dois canais de energia que vão regular essas características femininas e masculinas, respectivamente. É o que chamamos de lateralidade.

Pingalá se refere às características masculinas da personalidade, o lado direito do corpo e o hemisfério esquerdo do cérebro. São características do masculino (pingalá exacerbado) o indivíduo, o movimento, a solidão, o calor, a expansão, alegria, competição, a rotina, a organização, a ordem, o racional, o movimento, a agitação, o ativo, a força para fora (centrífuga), o tônus muscular, o crescimento, cálculos matemáticos, atividades repetitivas e rotineiras, a objetividade, o yang. 

Idá, por sua vez, se refere às características femininas da personalidade, o lado esquerdo do corpo e o hemisfério direito do cérebro. São características do feminino (idá exacerbada) o frio, a família, grupos, coletivo, reunião, contração, tristeza, imobilidade, depressão, cooperação, o caos, a desorganização, o improviso, a desordem, o emocional, o repouso, a depressão, o passivo, a força para dentro (centrípeta), a força de coesão, a flexibilidade muscular, o processo criativo, atividades não repetitivas, a subjetividade, intuição, práticas oraculares (astrologia, tarot, búzios, runa, I Ching, etc.), o ying. 

Por isso houve as bruxas - e não os bruxos. Por isso as mulheres são maioria nos grupos de autoconhecimento (incluo aí minhas alunas). Por possuírem predomínio de características femininas, estão mais ávidas de se conhecerem. 

Por outro lado, tudo o que antes era considerado como característica unicamente do homem pode ser encontrado também nas mulheres, o que limita as generalizações. Diz-se que as mulheres são mais intuitivas, mas e quanto aos homens que são astrólogos, videntes e pais-de-santo? Diz-se que os homens são mais ativos, e quanto às mulheres que cada vez mais estão atingindo postos de liderança e comando nas empresas e na política? Não se trata de dizer que são exceções que confirmam a regra, pois já não são mais exceção. 

Todos nós, em nossa estrutura psíquica, possuímos características masculinas e femininas mais ou menos exacerbadas, mais ou menos reprimidas (inconscientes). Quanto mais exacerbada estiver essa característica, mais reprimida estará a outra. A meta, segundo o Tantrismo, é equilibrarmos essas duas energias, essas duas forças psicológicas. 

Assim sendo, devemos olhar as pessoas não como homens e mulheres, e sim, como seres humanos com características masculinas e femininas em maior ou menor grau. Utilizando-se essa abordagem podemos constatar uma mudança de comportamento nas pessoas: os homens estão ficando mais femininos e as mulheres mais masculinas. Do ponto de vista do equilíbrio da personalidade, é ótimo que isto esteja ocorrendo. Estamos mais próximos da meta, do equilíbrio. 

Mais uma vez ressalto que não é uma questão de sexualidade nem de opção sexual. Não estamos buscando um estado andrógino ou mesmo hermafrodita. Cada humano deve ter bem clara e desenvolvida sua sexualidade, sem que isto implique na repressão de sua contraparte. Tudo que estiver reprimido irá se manifestar de alguma forma a nossa revelia, em um processo totalmente inconsciente. Neste sentido, podemos conjecturar que processos repetitivos em nossas vidas (padrões de relacionamento afetivos ou profissionais, por exemplo) são a nossa contraparte tentando se manifestar, vir à tona, tornar-se consciente, emergir das profundezas do inconsciente. 

 

Por isso buscamos o equilíbrio entre masculino e feminino, pois essa já é a dinâmica das forças em nossa psique.

Podemos, com tudo isso, dizer que a meta da vida, o que nos move, é a busca não de felicidade, mas de plenitude, quando todas as forças interiores se manifestam conscientemente. Utopia para a psicologia ocidental, meta dinâmica, porém alcançável segundo os padrões orientais.

*Alexandre Perlingeiro é mestre em Dakshina Tantra Yoga 

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